Relato Científico: O Universo das Abelhas – Diversidade, Ciência e Preservação Global
As abelhas representam um dos grupos mais fascinantes e essenciais da fauna terrestre. São insetos da ordem Hymenoptera, superfamília Apoidea, que engloba mais de 20.000 espécies conhecidas, espalhadas por todos os continentes, exceto a Antártida. Vivem em desertos, florestas tropicais, áreas urbanas e montanhas — onde houver flor, há potencial para vida de abelhas.
A ciência reconhece que, além de produtoras de mel, as abelhas são os principais polinizadores do planeta, sendo responsáveis pela reprodução de mais de 75% das espécies agrícolas e 90% das plantas com flores.
Origens e Evolução das Abelhas
As abelhas surgiram há aproximadamente 120 milhões de anos, no período Cretáceo, a partir de vespas ancestrais carnívoras que, ao longo do tempo, passaram a se alimentar do néctar e do pólen das flores.
Segundo Bryan N. Danforth, professor da Universidade Cornell (EUA), as primeiras abelhas evoluíram em paralelo à diversificação das angiospermas (plantas com flores). Seu trabalho em genômica e filogenia das abelhas é referência mundial.
(Fonte: Danforth, B.N. et al. “The Evolution of Social Behavior in Bees.” Annual Review of Entomology, 2019)
Classificação Global das Abelhas
As abelhas são classificadas em sete famílias principais:
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Apidae – A mais diversa, inclui as abelhas sem ferrão (Meliponini), Apis mellifera (abelha-europeia), mamangavas (Bombus), entre outras.
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Halictidae – Abelhas de suor, como Lasioglossum e Halictus. Muitas são sociais primitivas e comuns em ambientes urbanos.
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Megachilidae – Abelhas cortadeiras e solitárias, como Osmia e Megachile, famosas por usar folhas para construir ninhos.
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Andrenidae – Abelhas escavadoras do solo, muito comuns em regiões temperadas.
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Colletidae – Abelhas que secretam uma substância celofane semelhante à seda para seus ninhos.
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Melittidae – Grupo pequeno e restrito à África e Europa, considerado um dos mais antigos.
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Stenotritidae – Família restrita à Austrália, com apenas duas espécies conhecidas.
“A diversidade das abelhas é subestimada. Muitas espécies nem foram descritas ainda”, diz a entomóloga Drª Laurence Packer, da Universidade de York (Canadá), uma das maiores taxonomistas de abelhas do mundo.
(Fonte: Packer, L. et al. “Keeping the Bees: Why All Bees Are at Risk and What We Can Do to Save Them.” HarperCollins, 2010)
Distribuição Mundial e Biodiversidade
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Américas: Lar de milhares de espécies, especialmente na América do Sul, onde o Brasil é considerado um dos países com maior diversidade de abelhas nativas do mundo, incluindo as sem ferrão (Meliponini).
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África: Abriga muitas espécies solitárias e as temidas abelhas africanas (Apis mellifera scutellata), conhecidas por sua agressividade.
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Europa: Menos diversa, mas abriga a tradicional Apis mellifera, essencial para a apicultura mundial.
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Ásia: Grande variedade de espécies tropicais e cavernícolas como Apis dorsata.
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Austrália: Única com representantes da família Stenotritidae e ricas em abelhas solitárias nativas.
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América do Norte: Diversidade crescente de espécies urbanas, como Bombus impatiens, além de alto uso agrícola de polinizadores manejados.
Grandes Nomes da Ciência das Abelhas
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Karl von Frisch (Áustria/Alemanha): Prêmio Nobel por decifrar a "dança das abelhas", forma de comunicação entre operárias.
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Eva Crane (Reino Unido): Física que se tornou autoridade mundial em história da apicultura, escreveu The World History of Beekeeping and Honey Hunting.
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Charles D. Michener (EUA): Autor da obra monumental The Bees of the World (2000), uma enciclopédia taxonômica sobre todas as abelhas conhecidas.
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Paulo Nogueira-Neto (Brasil): Ecólogo e pioneiro da meliponicultura no país.
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Christoph Grüter (Alemanha/Reino Unido): Especialista em comportamento social e aprendizado em abelhas.
Ameaças Globais e Declínio Populacional
Estudos apontam que as abelhas enfrentam um colapso global devido a fatores como:
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Uso excessivo de agrotóxicos (neonicotinóides)
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Perda de habitat e urbanização acelerada
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Mudanças climáticas e doenças emergentes
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Monoculturas que empobrecem a flora nativa
A Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade (IPBES/ONU) alerta que mais de 40% das espécies de polinizadores invertebrados, principalmente abelhas, estão em risco de extinção.
(Fonte: IPBES Pollination Report, 2016. www.ipbes.net)
A Ciência e o Futuro das Abelhas
Atualmente, pesquisas em inteligência artificial, genômica, microbiota intestinal, imunologia e cognição das abelhas revelam que esses insetos têm capacidades cognitivas surpreendentes, como reconhecimento facial, tomada de decisões e até noções rudimentares de número.
“As abelhas são microcomputadores biológicos com asas”, diz o neurocientista Lars Chittka, autor de estudos sobre percepção visual e memória em Apis mellifera.
(Fonte: Chittka, L. “The Mind of a Bee.” Princeton University Press, 2022)
Fontes e Referências
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Danforth, Bryan N. et al. (2019) – The Evolution of Social Behavior in Bees. Annual Review of Entomology.
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Michener, Charles D. (2000) – The Bees of the World. Johns Hopkins University Press.
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Chittka, Lars. (2022) – The Mind of a Bee. Princeton University Press.
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Packer, Laurence. (2010) – Keeping the Bees. HarperCollins.
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Crane, Eva. (1999) – The World History of Beekeeping and Honey Hunting. Routledge.
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IPBES (ONU). (2016) – Thematic Assessment on Pollinators, Pollination and Food Production. www.ipbes.net
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Embrapa Meio Ambiente – www.embrapa.br/abelhas
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FAO – Food and Agriculture Organization – www.fao.org/pollination
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Universidade de Cornell – Lab of Ornithology & Entomology – https://entomology.cals.cornell.edu